Será que já
estamos preparados?
O crescente
aumento da oferta de produtos, em função dos investimentos no aumento de produção da
indústria nos últimos anos, aliado a desaceleração do crescimento do mercado interno
conduziu à alternativa que devemos garantir a ocupação das indústrias, isto é, o
nível de atividade na indústria nacional, e consequentemente o de emprego, a partir do
mercado internacional.
Com este cenário, recentemente pudemos ouvir de nosso Presidente Fernando Henrique
Cardoso, com ar de profecia, a frase: " - Exportar ou Morrer!". No Ministério
do Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior, já com tom mais objetivo, a matéria
ficou mais simpática e o novo programa de exportações brasileiras recebeu o lema:
"É Melhor Pra Gente".
O fato desencadeou uma série de ações de incentivo as exportações, como linhas
especiais de crédito, benefícios fiscais e iniciativas como a formação de consórcios
de exportação, que vem demandando estudos do governo para adequação legal de modo que
estes tenham acesso a linhas especiais de crédito e fundos de aval.
É conhecido ainda, que desde o início do processo de estabilização de nossa economia
(se é que um dia isto acontecerá), nossas indústrias vêem apresentando desempenho
competitivo crescente, podendo serem comparadas a qualquer outra indústria mundial, e
posicionando o Brasil como um dos países em desenvolvimento mais importante do cenário
mundial atual.
Mas para atuarmos no cenário internacional, a competitividade do produto não deve ser
entendida apenas de boa qualidade a um custo acessível, isto é, não é condição
suficiente termos o melhor produto dentro de nossas indústrias, este deve estar sim com o
consumidor.
E é exatamente neste ponto que ganha destaque uma atividade tão discutida nos últimos
tempos: a Logística. De modo simplista, logística é o fluxo otimizado de materiais e
informações desde o fornecedor, que para facilitar consideraremos o exportador, até o
cliente final, assim sendo, o desafio nacional não está exatamente na produção de
produtos de qualidade a custo baixo, mas sim fazer chegar o produto ao cliente, na
quantidade, prazo e local estabelecidos.
Parece simples como conceito, mas é complexo na execução, considerando ainda que
deslocar o produto de um local a outro agrega custo, inclusive aquele incidente sobre o
capital investido para produção de determinado produto que enquanto o mesmo encontra-se
"parado", agrega custo, o qual comumente designamos custo do estoque.
Assim, o custo total do produto nacional passa a ser composto pelo preço de venda deste
produto, acrescido dos custos de transporte, armazenagem e custo de capital investido em
estoque.
Vale ressaltar que os custos logísticos no Brasil estão além da estratosfera se
comparados com as melhores práticas, principalmente quanto o custo do transporte. Como
referência, o custo logístico nacional, representa nada menos que 21,5% da receita
operacional líquida das empresas produtoras, considerando que destes 7,1% estão
associados ao transporte, enquanto que na Europa estes índices são 12,1% e 3,7%
respectivamente, conforme apurado em recente pesquisa realizada pela IMAM Consultoria.
Isto significa que nossos produtos beneficiados pela atual relação - Real/Dólar - pode
ter toda esta vantagem diluída pelos custos logísticos associados. Assim, a
racionalização e maior eficiência dos sistemas logísticos de suporte ao comércio
exterior visam garantir ganhos de competitividade aos produtos exportados através de
nossos portos, aeroportos e rodovias, visando a redução dos custos dos serviços
logísticos e do tempo total de deslocamento deste produto. Do fabricante (exportador) ao
cliente (importador), numa perspectiva de operação, conhecida como porta-a-porta -
"door-to-door".
Para uma realidade, onde o custo do capital é tão elevado como a nossa, o tempo total
das operações logísticas constituem elemento condicionante na formação de estoques e
consequentemente custo. Assim, devemos deslocar o material tão rápido quanto possível,
resultando em uma estratégia de embarques menores e mais freqüentes. À medida que os
tempos de entrega são reduzidos, os clientes passam a trabalhar com menor estoque e
conseqüente redução de capital de giro. No sentido oposto, um aumento no tempo
significará transações comerciais a custos mais elevados.
Quanto a realização do transporte do produto a valores competitivos, isto dependerá
fundamentalmente da capacidade dos exportadores desenvolverem parcerias com os prestadores
de serviços logísticos, também conhecidos como operadores logísticos.
De maneira objetiva, o nível de competitividade dos exportadores aumentará, caso estes a
partir de parcerias com os operadores logísticos, trabalharem com rotas de menor custo e
tempo de transporte, desde a expedição pelo exportador até o recebimento pelo
importador.
Em termos práticos, para garantirmos a competitividade do produto brasileiro, devemos
estruturar uma logística capaz de assegurar que os produtos expedidos pelas indústrias
sejam transportados com grande facilidade pelos modais de exportação para entrega ao
menor prazo a cliente.
Nesse contexto é que temos a maior dificuldade. A exemplo do que ocorreu com a oferta de
energia elétrica, telefonia e outros serviços que necessitam infra-estrutura, o Governo
optou pela estratégia de privatização, visando aumento da oferta destes serviços a
partir do interesse de terceiros.
Considerando que o Estado de São Paulo representa cerca de 35% das exportações
brasileiras, contra 11% de Minas Gerais, o segundo maior exportador, deveríamos entender
que os aeroportos e portos que atendem estes pólos exportadores deveriam ter o maior
aporte de investimento em infra-estrutura, o que proporcionalmente não é verdade, haja
vista a questão da dragagem do Porto de Santos, o mais importante porto brasileiro, sendo
conduzido ao descaso sua situação atual, enquanto outras regiões, notadamente não
exportadoras, tem ganho aporte significativo de recursos.
Os produtos manufaturados representam mais de 58% das exportações, que somados aos
semi-manufaturados alcançam a expressiva marca de 73%, descartando a imagem de que somos
um País com potencial de exportação de produtos básicos, como: minério de ferro, soja
e café.
A continuidade na crise Argentina deve contribuir para mudança no cenário de
exportação brasileiro, e a União Européia e Estados Unidos deverão concretizar-se
como os grandes mercados para consumo de produtos brasileiros, orientando para uma
necessidade de investimento em infra-estrutura portuária e aeroportuária.
Considerando o expressivo aumento de produtos manufaturados e semi-manufaturados na
composição das exportações brasileiras, o momento é de nos preocuparmos com uma
infra-estrutura logística para intensa movimentação de contêineres, inclusive para
embarcações cada vez maiores. Para termos uma idéia, a Samsung Heavy Industries da
Coréia deverá inaugurar seu navio para 9.600 TEUs em 2004, como comparação, a maioria
dos navios em operação no mundo são para até 5.000 TEUs.
O impacto desta nova frota de super-cargueiros irá afetar em muito os portos no mundo.
Segundo estudos desenvolvidos pelas autoridades na Bélgica, com o advento das novas
embarcações, apenas 7 ou 8 portos ou melhor "mega-portos" irão ser capazes de
atender a estes navios.
De acordo com os transportadores marítimos, cada vez mais, deveremos enfocar o conceito
de portos dos tipo mega, hub e regional. Assim, os super-cargueiros deverão receber os
contêineres transportados por navios menores, que partirão dos portos tipo hub -
abastecedores - que por sua vez, receberão os contêineres de navios advindos de portos
regionais. E hoje seguramente não estamos preparados para este cenário.
Desta maneira é que as coisas podem caminhar para uma infra-estrutura insuficiente no
escoamento dos produtos aqui fabricados. Em outras palavras, poderemos vivenciar uma
oferta de serviço em determinadas regiões, sem a respectiva demanda e outras regiões
com demanda superior a oferta. Tudo isto devido a falta de uma visão sistêmica da
logística, fruto de incentivos isolados sem a devida configuração de pólos e
"corredores" para exportação, também conhecidos como plataformas
exportadoras.
Esta falta de coordenação não contribuirá para o desenvolvimento das exportações
brasileiras, levando a uma elevação do tempo total de deslocamento, conseqüente aumento
no custo associado e uma diminuição na competitividade de nossos produtos.
Devemos deixar a vaidade e interesses isolados de lado e passarmos a entender que as
forças de mercado e a capacidade empreendedora de uma região é o melhor caminho para
estabelecer maneiras mais seguras para aplicação dos recursos, que geralmente são
escassos.
Uma plataforma de exportação, fundamenta-se num pólo produtivo capaz de gerar de alguma
forma, capacidade competitiva internacional. Assim, estabelecida esta capacidade, podemos
estruturar instalações logísticas que assegurem que a vantagem econômica e de
qualidade de nossos produtos seja complementada ainda por uma logística competitiva.
De modo objetivo, o Governo deve ater-se a acompanhar as leis de mercado sem a criação
de incentivos danosos à competitividade, simplesmente em função de interesses
políticos. O porto ou qualquer zona de comércio exterior não deve ser entendida como
uma área isolada, os produtos que serão exportados freqüentemente deslocam-se por
muitos quilômetros até chegarem a este ponto, quer seja por rodovias ou ferrovias, que
mais uma vez por falta de visão integrada não estão em coordenação com uma logística
total.
Basta observarmos que não existe uma linha regular para transporte ferroviário de
produtos até o porto de Santos, no litoral de São Paulo, sendo que mal temos
estruturadas rodovias que atendam bem esta região, tanto que apenas após muito tempo
saiu do papel a duplicação da rodovia dos Imigrantes.
Ainda para ilustrar a falta de infra-estrutura, basta verificarmos que apenas 150.836 km
de rodovias estão pavimentadas, de uma malha total de 1.658.677 km, isto é, apenas 9%,
segundo estatísticas do MDIC - Secex.
Em oposição a isto, tivemos investimentos consideráveis sendo canalizados para obras,
que sob o lema do desenvolvimento regional, tem criado verdadeiros "elefantes
brancos" com alta capacidade operacional e baixa demanda.
Associado a este cenário de baixa infra-estrutura, temos ainda a questão fiscal
aduaneira que deveria agir como facilitadora do processo, e não como dificultadora.
Acelerarmos o processo de desembaraço aduaneiro apenas para exportação pode não ser a
solução, haja vista que boa parte dos manufaturados e semi-manufaturados exportados
dependem de componentes importados, e o que é sabido e notório é que tais questões
deixam a desejar quanto a agilidade no processo.
A hora é de questionarmos nosso modelo logístico atual e passarmos a apoiar os
investimentos que estão alinhados com as demandas de mercado, sem deixar de considerar a
adoção de modelos simples e racionalizados, para não deixar que o lema: "- É
Melhor para Gente!" não fique apenas como mais uma iniciativa que não deu
resultado.
junho/2002
Edson Carillo Júnior,
Engenheiro de
Produção Mecânico, pós-graduado em Administração Industrial. Atuou em pesquisa e
desenvolvimento tecnológico na cia. Ultragaz e egenharia industrial na Kibon. É Diretor
da IMAM, atuando como Consultor e Instrutor nas áreas de Desenvolvimento Organizacional e
Logística.
Tel. (0--11) 5575 1400 imam@imam.com.br
Esta página é parte integrante do www.guiadelogistica.com.br .