As Auto-Estradas...Marítimas!
1. Quando, nos fins da década de cinquenta, princípios da de sessenta,
se começou a fazer sentir, em Portugal, um forte ataque das auto-estradas à
navegação costeira, que conduziu ao seu quase completo desaparecimento, estávamos bem
longe de pensar que ainda haveríamos de falar da importância, nesse processo, das
auto-estradas
mas agora marítimas! É uma espécie de regresso às origens, aquilo a
que estamos a assistir: o reassumir, por parte do transporte marítimo, do seu verdadeiro
papel de modo de transporte amigo do ambiente, ao qual será de augurar uma enorme
perspectiva de futuro.
Tem vindo a ser dado um especial destaque, na União Europeia, ao tema das chamadas
sea motorways, ou auto-estradas marítimas. O Livro Branco sobre a Política
Comum de Transportes, de 12 de Setembro de 2001, concedeu um marcado ênfase aos modos de
transporte marítimo e fluvial (e também ao ferroviário, diga-se de passagem) no
desenvolvimento daquela referida Política Comum. Faz-se grande esforço e denota-se
excepcional empenhamento, nos meios comunitários, pela substituição paulatina, mas
persistente, dos acréscimos futuros do transporte rodoviário por aumentos nos outros
referidos modos de transporte. A Europa é a favor da utilização das suas costas e dos
seus inúmeros portos (mais de 1000!), como suporte à circulação das mercadorias que
transitam pelo espaço europeu. Caminha-se a passos largos, com as auto-estradas
marítimas, para a adopção prática da solução rodo-marítima de transporte e a
efectiva implementação do Transporte Marítimo de Curta Distância (TMCD). Segue-se
agora com mais convicção e outra confiança, parecendo ter-se percebido
finalmente que a única maneira de compensar a rodovia poluidora que nos
acabará por matar! é o retorno ao mar em regime de serviço público.
Vai-se certamente em breve escolher corredores, as auto-estradas marítimas, e
dotá-los de condições de terminais (dedicados), de procedimentos simplificados, de
custos reduzidos, etc., que sejam atractivos para os armadores, por lhes garantirem em
princípio viabilidade. Então aí, a União e os Estados-membros abrirão concurso para a
exploração do TMCD nessas verdadeiras auto-estradas marítimas, segundo as regras do
serviço público e contando com a dinâmica comercial da economia de mercado. Trata-se da
máxima que diz que O Estado deve substituir-se aos particulares, enquanto a
iniciativa destes não aparecer, e quando se encontra em causa o interesse público.
2. O que será necessário realizar, também em Portugal, para corresponder a esse
importante movimento europeu, é a pergunta que se impõe colocar.
Já foi praticamente feito tudo para que Portugal retornasse ao mar, sem
qualquer sucesso. Tudo em vão. A EXPO98 dedicada ao mar, não o recuperou.
Ultimamente, já não existe, nem Secretaria de Estado da Administração Marítima e
Portuária, nem, muito menos, Secretaria de Estado da Marinha Mercante. Não se fala do
mar. Não se lhe liga. O Governo menospreza-o. Essa é que é a verdade.
Era preciso actuar de uma maneira completamente diferente. Desde logo, procurando
acompanhar o referido movimento europeu, substitutivo da rodovia pela via marítima e
fluvial. Depois, criando um dispositivo institucional que, em permanência, acompanhasse o
sector. Não através de uma qualquer personalidade que o tutelasse, mas com recurso a uma
entidade competente e sabedora. Assim como, só para dar um exemplo, o que se passa com a
Segurança Social, cujo Ministro, que detém a pasta, é pessoa que se encontra nessas
condições, independentemente de se poder estar, ou não, de acordo com as suas ideias.
Ressalta, a saciedade, que se trata de alguém que conhecia antes os problemas e as
matérias, e que põe tudo isso, e a sua criatividade, ao serviço do lugar!
3. O mar precisa de ser considerado em Portugal, de novo, como no tempo dos
Descobrimentos, um verdadeiro desígnio nacional. Fazer parte dos nossos valores. Assim
como o foram Deus, Pátria e Família no passado, mas com muito mais
empenhamento, quase ardor, à semelhança dos valores da globalização e
competitividade que, por exemplo os coreanos do sul adoptam como seus
objectivos de vida e progresso. Fazer do regresso ao mar um desígnio
nacional, significa assumir uma diferente atitude a seu respeito. Nas Escolas, nas
empresas, nos Ministérios, no Parlamento, no Governo, enfim, nos meios de comunicação
social.
Os agentes que asseguram a actividade marítima, os armadores, são relativamente
frágeis, e carecem de ser estimulados e apoiados, dando à sua acção maior
abrangência. Aos utilizadores, a quem tanto dá usar navios nacionais como estrangeiros,
impõe-se inculcar um espírito de tudo o que é português é bom! E tal não é fácil.
Há que persistir nisso.
O sistema regulador existe, que é o Instituto Marítimo-Portuário, mas tal instituição
precisa de maior poder de intervenção, traduzido em disponibilidade de meios, e mais
agilidade, com que certamente irá contar.
Finalmente, há que fazer uma aposta forte na formação e educação, através da Escola
Náutica Infante D. Henrique, e estamos tanto mais à vontade para o dizer, quanto é
certo que acabamos de nos aposentar da função que nela tínhamos de professor...
A Escola é um projecto decisivo, neste momento! Há que olhar para ela com
olhos de ver. Fazer dela uma outra promoção e publicidade. Mais intensa e incisiva. Os
diplomados por ela não estão desempregados. Muito pelo contrário. Não há oficiais da
marinha mercante para as necessidades do país e estas já não são muito grandes.
Tem de entender-se depois que se trata de uma instituição de ensino de âmbito nacional
(porventura internacional) e altamente especializada. Por força disso, na apreciação do
seu desempenho, não podem ser tidos em conta rácios médios de alunos por professor, ou
similares, atendendo a que a manutenção da escola é um desiderato de interesse nacional
prioritário. Só há que reforçar o seu protagonismo e assegurar a sua aproximação ao
sector, mais concretamente ao armamento nacional.
Tem de haver vontade política para levar por diante todo este intenso labor, de
inexcedível interesse nacional. Não se pode, de facto, perder mais tempo.
A. Figueiredo Sequeira,
Professor e Consultor de Transportes, Portos e Logística
figsequeira@mail.telepac.pt
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