Dia destes entrei, em uma loja Fran´s Café. Como de hábito em qualquer
cafeteria, fiz meu pedido padrão: um expresso e um pão de queijo. Qual não foi minha
surpresa ao receber o café cuidadosamente apoiado sobre uma pequena bandeja, acompanhado
de um elegante copo contendo água mineral gasosa e um folheto explicando tratar-se de uma
tradição italiana: a água com gás aguça as papilas enaltecendo o sabor do café que
será sorvido. E todo este cuidado pelo mesmo preço de um expresso tradicional...
Num destes finais de semana,
resolvi dar descanso ao vídeo-cassete e dirigi-me a um cinema da rede Cinemark para apreciar um bom filme. Fiz a opção
por esta rede raciocinando que, em virtude do grande número de salas, as filas seriam
pouco significativas. Ledo engano. Apreciei, sim, fila para adquirir o ingresso, fila para
acessar a sala, fila para comprar os acessórios pipoca e refrigerante. E me vi
estarrecido diante do custo de R$ 3,50 por um copo de Coca-Cola, valor suficiente para
adquirir três litros da mesma bebida, e de R$ 7,00 por um pacote de pipocas, valor
correspondente a quatro vezes a mesma porção para se fazer no forno de microondas.
Meses atrás, resolvi retomar a
prática da natação e fui ter um diálogo com minha antiga academia, a Runner. Solicitei-lhes uma proposta para que eu
retornasse ao quadro de alunos mediante um preço diferenciado considerando-se meu
histórico. A resposta que obtive dizia que eu teria que me adequar às normas vigentes
para novos alunos. Seria uma assertiva aceitável, se não tivesse partido do Departamento
de Fidelização da empresa que, teoricamente, deveria zelar pela manutenção de seus
associados.
Três situações distintas,
envolvendo empresas de renome, que nos fazem refletir sobre a questão dos preços
relativos e, acima disto, sobre o que vem a ser diferenciação.
Concorrência Monopolística
Lembro-me das aulas de Microeconomia.
Tinha dificuldades para aceitar certos conceitos que entravam em rota de colisão com
minha lógica. Um dos poucos conceitos que me marcaram foi-me apresentado quando estudava
a organização dos mercados e formação de preços.
Segundo a teoria microeconômica, os
mercados operam em concorrência perfeita ou imperfeita. O primeiro tipo caracteriza o
modelo ideal: muitas empresas participantes, ausência de barreiras à entrada e saída do
mercado, políticas de preços não-regulamentadas. O segundo tipo é formado pelo
monopólio, quando uma única empresa atua isoladamente no mercado, normalmente impondo
barreiras técnicas, econômicas ou burocráticas à entrada de novos players, praticando uma política de preços
própria que precisa ser regulada por um órgão neutro; o oligopólio, que se diferencia
do monopólio apenas pelo fato de haver mais de uma companhia atuando no mercado, porém,
não muitas; e a concorrência monopolística.
Esta última modalidade guarda consigo
um conceito interessante. Aborda uma situação na qual as empresas atuam dentro de um
mercado altamente concorrencial, onde não há entraves de qualquer ordem e todos
enfrentam as mesmas oportunidades e dificuldades. Todavia, dentro deste contexto, uma
empresa pode se destacar mediante a diferenciação de seu produto ou serviço. Fazer algo
simplesmente diferente e, assim, tornar-se única, exclusiva, desejada no coração e na
mente do consumidor. Tecnicamente, criar um nicho tão bem delimitado que a capacita a
exercer um autêntico monopólio. Por isso, concorrência monopolística.
À luz deste conceito, passei a
observar como estamos o tempo todo exercendo a concorrência monopolística em nossas
vidas. A começar pela vitória do espermatozóide tenaz que, dotado de agilidade,
velocidade, preparo e estilo, no ato da fecundação, supera todos os demais concorrentes.
Ao conquistar o par romântico, também nos fizemos notar em meio aos demais pretendentes.
A oportunidade de emprego também foi sancionada com êxito dentre outros postulantes ao
cargo.
Responsável por quem Cativas
Assim, passei a nutrir verdadeira paixão pelo conceito de
diferenciação. Passei a compreender o porquê de deixar mais Reais por um pão de queijo
no Fran´s Café, quase sem perceber é
porque quero o mimo. Passei a compreender o porquê de ser expropriado por uma pipoca e um
refrigerante num Cinemark é porque quero a comodidade. Passei a compreender o
porquê de ter perdido o encanto pela Runner é porque quero coerência no discurso
que me vendem.
Tu não és ainda
para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho
necessidade de ti. E tu não tens necessidade de mim. Não passo a teus olhos de uma
raposa igual a cem mil outras raposas. Mas se tu me cativas, nós teremos necessidade um
do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo....
O Pequeno Príncipe, de Exupéry, conhecia
muito de concorrência monopolística quando cunhou a famosa expressão tu te tornas eternamente responsável por aquilo
que cativas. Por isso, abrir a porta do carro para a garota adentrá-lo torna o
cavalheiro admirado. Por isso, o vendedor que procura descobrir a necessidade de seu
cliente para depois lhe apresentar uma solução é preferível ao mero tirador de
pedidos. Por isso, a empresa que identifica o desejo mais subliminar de seus consumidores
pode dar-se ao luxo de vender o que produz ao invés de produzir o que se vende.
Mas, no jogo da diferenciação, que fique claro uma coisa. Não
é a diferenciação tecnológica (baseada nas inovações), a qualitativa (sediada na
adequação) ou a mercadológica (ancorada na força e glamour das marcas) que conferem
perenidade às relações. O mundo está comoditizado. Os produtos apresentam as mesmas
características, os profissionais detém os mesmos MBA´s, a comunicação está
massificada. A única diferenciação efetivamente sustentável ao longo do tempo é
aquela baseada em pessoas. No brilho do olhar, na maciez da voz e no calor do toque,
aspectos que máquina ou virtualidade alguma será capaz de reproduzir ou substituir.
outubro/2.003
Tom Coelho,
Graduado em Economia pela FEA/USP, Publicidade pela ESPM/SP
e especialização em Marketing pela MMS/SP, é empresário, consultor, escritor e
palestrante, Diretor da Infinity Consulting, Diretor do Simb/Abrinq e Membro Executivo do
NJE-Fiesp.
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