A Conferência das Nações Unidas para o Comércio e
Desenvolvimento (Unctad) prevê que o Brasil será o maior país agrícola do mundo em dez
anos. Pelos indicadores que o setor vem apresentando, tudo indica que estamos seguindo
para esse caminho. A produção nacional encerrou o período de 2003 com 123 milhões de
toneladas de grãos (um crescimento de 27% em relação a 2001/2002), movimentando 35% do
Produto Interno Bruto (PIB). E para 2004, a expectativa é de 132 milhões de toneladas de
grãos. Esse montante nos coloca entre os líderes mundiais na produção de soja, milho,
açúcar, café, carne bovina e de frango.
Mas todos esses bons resultados, assim como as expectativas futuras, correm sérios riscos
de sofrer um pesado revés já este ano se os problemas relacionados à infra-estrutura
logística (o maior obstáculo para o desenvolvimento do agronegócio do Brasil) não
forem solucionados. O próprio Ministério da Agricultura já admitiu que a safra de
grãos de 2004 pode enfrentar sérios problemas de escoamento por causa da falta de
investimentos no setor. O agronegócio é justamente o que mais sofre com a ineficiência
dos canais de transporte, cujas deficiências são responsáveis por prejuízo
correspondente a 16% do PIB, segundo estudo do Centro de Estudos de Logística da
Universidade do Rio de Janeiro.
O gargalo logístico envolve praticamente toda a infra-estrutura de transporte do país.
De acordo com a Confederação Nacional dos Transportes (NTC), 82% das estradas
brasileiras apresentam sérias deficiências, entre elas mais de 8 mil quilômetros com
trechos de buracos e afundamentos. Acrescente-se a idade avançada da nossa frota de
caminhões (18 anos) para descobrir porque a velocidade média dos veículos das estradas
para os portos foi reduzida em 40% nos últimos anos.
Por outro lado, as ferrovias, embora tenham recebido investimentos com a privatização,
ainda estão longe de suprir a demanda do setor de agronegócio e se consolidar como uma
alternativa viável ao transporte rodoviário. Além da ampliação da malha de 30 mil
quilômetros de extensão (praticamente igual a do Japão, país 22 vezes menor que o
Brasil) é urgente a modernização do maquinário. Com os trens e bitolas atuais, a
velocidade média das composições não ultrapassa lentos 25 km/h.
Ao mesmo tempo, deixamos de fazer uso de canais de transporte de grande potencial, caso
dos 42 mil quilômetros de hidrovias, em que apenas 10 mil quilômetros são efetivamente
utilizados. Como resultado, sistemas como o do Tietê-Paraná, com 2,4 mil quilômetros e
que consumiu US$ 2 bilhões em investimentos públicos em vários governos, escoa apenas 2
milhões de toneladas de carga/ano, apenas 10% de sua capacidade total.
No transporte marítimo de cabotagem (outro canal com grande potencial no Brasil)
assistimos a uma situação semelhante. Embora a privatização tenha contribuído para a
modernização dos portos, o excesso de mão-de-obra (que chega a ser de três a nove
vezes superior aos portos europeus e sul-americanos) ainda mantém os padrões de
produtividade baixos. Enquanto o índice internacional de movimentação é de 40
contêineres/hora, nos portos brasileiros essa média é de 27. É um dos motivos pelos
quais todos os anos caminhões formam filas de até 150 quilômetros de extensão para
descarregar suas cargas no porto de Paranaguá (PR).
Consciente de que sozinho não conseguirá reverter esse quadro, o governo federal já
busca o apoio da iniciativa privada. Por meio do plano de Parceria Público-Privada,
pretende investir R$ 13,68 bilhões em 23 projetos de reformas em rodovias, ferrovias,
portos e canais de irrigação até 2007.
É preciso destacar também que, além dos recursos, a iniciativa privada ainda tem muito
a contribuir para o desenvolvimento da infraestrutura do país, incentivando a criação
de pólos intermodais de transporte (integração entre os sistemas rodoviário,
ferroviário, marítimo, fluvial e aéreo) para redução de custos e aumento do nível de
serviços.
Um exemplo do potencial desses pólos é representado por um estudo do Geipot (Empresa
Brasileira de Planejamento em Transportes, ligada ao Ministério dos Transportes). Já em
2000, a empresa alertava que o melhor aproveitamento e a utilização racional dos canais
de transporte seria capaz de economizar em cerca de US$ 75 milhões os custos anuais de
escoamento de grãos. Para ilustrar o que estamos falando, basta destacar que um único
comboio na hidrovia Rio Madeira tem capacidade para 18 mil toneladas de grãos,
substituindo 600 carretas de 30 toneladas nos eixos Cuiabá (MS) / Santos (SP) e Cuiabá
(MS) / Paranaguá (PR).
Essa redução dos custos de transporte contribuiria diretamente para reduzir os custos de
nossos produtos, tornando-os mais competitivos no mercado internacional. Isso sem falar da
economia de combustível e de fretes, na redução do tráfego e desgaste das rodovias.
Como se vê, os obstáculos para o crescimento do agronegócio brasileiro são imensos,
mas as soluções também existem e estão prontas para serem colocadas em prática. O que
esperamos, como empresários, executivos e profissionais ligados à logística, é de que
tanto o governo nas esferas federal, estadual e municipal, quanto a iniciativa privada,
mantenham a sua determinação em modernizar a infra-estrutura brasileira.
fevereiro/2.004
Altamiro Borges,
Presidente da Associação Brasileira de Logística (ASLOG)
e da Universidade da Distribuição (UnD).
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